O combate à violência de gênero foi tema da edição 171 do Podcast do Correio, na última sexta-feira. Em conversa com as jornalistas Adriana Bernardes e Mariana Niederauer, Francisco Tojal Dantas Matos, presidente do Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid), comentou sobre os números elevados de crimes desse tipo. Ele também falou sobre a educação e a prevenção da violência, do diálogo do Fonavid com a Câmara e o Senado, da capacitação de juízes e de como os homens precisam se engajar no combate à violência doméstica.
Segundo o entrevistado, dados divulgados no ano passado indicam que 1.467 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil em 2023, o que demonstra a necessidade de conscientização sobre esse tipo de violência. “Isso representou um aumento de quase 1% em relação a 2022. Dessas vítimas, 64% foram mortas em suas próprias casas, comprovando que nem os lares são pontos seguros para mulheres”, ressaltou.
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Matos destacou que dos 1.467 feminicídios registrados em 2023, 64% foram cometidos contra mulheres negras. “Precisamos olhar para as interseccionalidades não apenas de gênero, mas também de raça. Infelizmente, historicamente as mulheres negras são muito mais vulneráveis do que as brancas. Isso se reflete nos números”, alertou.
O presidente do Fonavid acredita que os caminhos para combater essa violência estão na educação e na prevenção. Mas de acordo com ele, as decisões recentes de empresas de tecnologia, como a Meta, de aumentar a “liberdade de expressão”, teriam feito com que a frequência com a qual os discursos de ódio são propagados em redes sociais aumentasse. Para Matos, esses ataques virtuais acabam, muitas vezes, se direcionando às mulheres.
“A gente precisa de uma regulação das redes. As pessoas precisam entender que liberdade de expressão não é discurso de ódio. Quando a gente fala em discurso de ódio, há uma carga muito grande de ódio às mulheres. A educação é a maior arma contra a violência. Só a partir da prevenção a gente vai conseguir mudar essa realidade”, opinou.
Um passo importante seria a participação ativa do público masculino na luta pelos direitos das mulheres. “Precisamos apoiar essa causa, participar dos diálogos, ouvir as mulheres e possibilitar que elas cheguem a determinados espaços também. Precisamos conversar com outros homens. Tem gente que não escuta as mulheres, mas talvez escute um homem falando sobre o mesmo assunto”, afrimou.
Na opinião do presidente do Fonavid, é necessário que os homens se deconstruam e reconheçam seu papel de privilégio em relação ao tema. Ele compartilhou uma fala da professora Silvia Pimentel, uma das idealizadoras da Lei Maria da Penha, segundo a qual o feminismo é uma bandeira que deve ser abraçada pelas mulheres, mas que os homens têm de ser parceiros da causa.
Matos acredita que para conseguir melhorias em relação aos direitos das mulheres é preciso um diálogo harmonioso entre os Três Poderes. Nesse sentido, é importante a comunicação da Fonavid com a Câmara dos Deputados e o Senado. “Essa necessidade se intensifica pelo momento vivido no país, no qual frequentemente existem pautas discutidas nas casas legislativas que trariam retrocessos para alguns direitos das mulheres.”
Outro foco da entidade na questão de gênero é a capacitação de juízes para diferenciar as especificidades de pautas do tipo. “A capacitação dos juízes e juízas do Brasil é essencial para que a gente mude o olhar da Justiça, para que a gente fale em uma Justiça mais humanizada, que enxergue as pessoas e esteja próxima às necessidades das jurisdicionadas e dos jurisdicionados”, explicou Matos, citando como exemplo o direito de ir e vir, que apesar de comum a todos os cidadãos, é violado às mulheres com mais frequência, fazendo com que muitas tenham medo de sair à noite sozinhas, medo menos comum no público masculino.
“O legislador, muitas vezes, não prevê essa assimetria e fica para a gente, do Judiciário, analisar caso a caso. É preciso sensibilizar as pessoas para que elas tenham esse olhar diferenciado”, completou.
* Estagiário sob supervisão de Eduardo Pinho